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Ferrovia Norte-Sul: hoje uma unanimidade nacional

“Em nenhum país, com as dimensões do Brasil, o modal ferroviário deixa de ser o mais importante, seguido da cabotagem. As rodovias são alimentadoras dessa matriz. Só o Brasil era exceção no mundo dos grandes países em área territorial. Isso, atrasou o desenvolvimento brasileiro, criou o terrível Custo Brasil.”

Quando lançamos a Ferrovia Norte-Sul, nos parecia que tínhamos dado um choque elétrico na nação. A indústria de São Paulo se levantou contra, parecia que a recém-criada produção de caminhões do país, iria quebrar. Os aproveitadores da situação se juntaram com força contra, com medo de perder privilégios, na verdade, contrários ao interesse maiores da nação, extremamente protegidos por lobbys poderosos, na época, que envolviam a formação da opinião nacional. Já tinham tido sucesso, acabando com a cabotagem que funcionava no país anos atrás, um meio de transporte de cargas de custos muito baixos, se comparado ao transporte rodoviário de longa
distância. Foi então que o modal rodoviário passou a dominar o transporte de cargas no país.

Em nenhum país, com as dimensões do Brasil, o modal ferroviário deixa de ser o mais importante, seguido da cabotagem. As rodovias são alimentadoras dessa matriz. Só o Brasil era exceção no mundo dos grandes países em área territorial. Isso foi terrível, atrasou o desenvolvimento brasileiro, criou o Custo Brasil, vigente até hoje. E, assim, viramos presa fácil daqueles que se locupletavam com o custo Brasil.

Foi fácil mobilizar a imprensa muito poderosa do Sudeste que, sem exceção, abriu fogo cerrado contra o projeto, contra o qual valia tudo. Ali, o que ainda se chamava de mentira e que hoje se chama de Fake News, era a regra do jogo. E ai de quem defendesse o projeto, era imediatamente vítima de aleivosias. Isso aconteceu com um banco alemão, que nos endereçou uma carta em papel timbrado, em português, querendo financiar todo o projeto, explorar a ferrovia e as estações. E quando souberam disso, pois divulgamos, foram em cima do
banco, que demitiu o diretor e divulgou que nós tínhamos feito uma tradução mal feita do alemão, o que originou o engano, diziam. isso me obrigou a publicar nos jornais a carta original, em português, sem engano nenhum. E quase resulta em uma crise diplomática entre os dois países.

Um episódio triste deu-se dentro do governo. Certa vez eu fiz, o que na época se chamava Exposição de Motivos, para obter recursos para a construção da ferrovia, e que teria que ser assinada pelos ministros do Planejamento, da Fazenda e por mim. Obtive, rapidamente, a assinatura do ministro do Planejamento, assinei também e fui procurar o ministro da Fazenda, Dilson Funaro, que inicialmente se negou a assinar, pois a imprensa já noticiava a sua demissão pelos problemas na sua gestão, mas eu tanto insisti que ele assinou. Quando ia saindo, ele me pediu que não publicasse ainda. Eu achei inusitado o pedido, mas acatei. No dia seguinte, Funaro já estava demitido e os jornais publicaram uma entrevista bombástica dele, afirmando que foi demitido por se negar a assinar o pedido de recursos para a Ferrovia Norte-Sul: uma verdadeira canalhice, uma covardia dele que, com mentiras, queria justificar a sua incompetência. Quando vi aquilo fiquei indignado, chamei a imprensa e
mostrei o documento assinado por ele.

Tempos depois ele procurou a Veja, que publicou uma frase dele me chamando de canalha. Ele estava muito doente, com doença terminal nessa altura e nunca mais o encontrei. Eu apenas defendi o governo de uma
canalhice injusta, mas ele passou a me odiar porque destruí a tentativa de enxovalhar o governo a quem serviu e onde teve dias de glória. Aconteceram muito mais coisas assim, mas eu vou descrever melhor a situação em um livro que pretendo publicar.

Até uma denúncia de corrupção foi feita, onde não havia corrupção nenhuma. E até hoje ignoram a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), instalada no Senado, por solicitação de um senador inimigo do projeto, como pelos resultados a que chegaram um inquérito da Polícia Federal e do Ministério Público e de uma Sindicância Interna no próprio Ministério, que mandei abrir. Todas foram unânimes em concluir que não havia nenhuma corrupção, nemdolo, nem prejuízo ao Erário, absolutamente nada, mas ninguém fala nisso, só que houve “denúncias de corrupção” – o que não houve no governo Sarney.

Obra fundamental – É importante dizer que, 36 anos para concluir uma obra imprescindível ao país, como é reconhecida hoje, mostra bem o que foi a luta para fazê-la, principalmente nos seus primeiros anos. Mas é bom dizer que ficou pronta a espinha dorsal e que ela só estará completa quando suas costelas estiverem igualmente prontas. A ligação com Mato Grosso, estado que é o maior produtor de grãos do país, será completa com o funcionamento da FICO – Ferrovia de Integração do Centro Oeste, com a Bahia, com a FIOL – Ferrovia de Integração Oeste Leste, ligação da FNS em Estreito, com Balsas e o Piauí, através da Ferrovia FE-232 e com os portos da Baía de São Marcos, por meio da Ferrovia FE-317, que se liga ao Terminal Portuário de Alcântara,
mas também ao Porto do Itaqui e ao Terminal Portuário da Ponta da Madeira, pois a Ferrovia dos Carajás está perto de atingir a sua plena capacidade, incapaz de transportar os 100 milhões de toneladas de grãos que a ESALQ- LOG, da USP, diz que virá para cá, em 2030, quando tudo estiver funcionando. E aí, sim, teremos uma mudança completa na matriz de transporte do país, atingindo de morte o Custo Brasil.

36 anos depois é um absurdo tão grande que a maioria dos jornalistas que escreveram a notícia de sua inauguração nem estavam nascidos quando tudo começou e nem sabem bem da luta que foi. É um absurdo, na verdade, o que aconteceu, que só se tornou realidade com a condução serena do presidente José Sarney.

Uma das maiores críticas que faziam ao projeto da FNS era de que “ligaria o Nada ao Coisa Nenhuma”. Até hoje tenho dúvidas sobre o que queriam dizer, pois a ferrovia ligaria o Porto de Santos ao do Itaqui. Qual seria o Nada e qual seria o Coisa Nenhuma?

Artigo de José Reinaldo Tavares

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