fbpx
LocalPolítica

As barreiras para favelas continuam

Por Osmar Gomes dos Santos

O discurso “a favela venceu” muito repercutido pela grande mídia, que tenta pautar o sucesso e a superação de quem veio do gueto, não se reveste de verdade em sua integralidade, na vida como ela é.

A favela segue como é, nada muda. Alguns poucos vencem, a grande maioria segue “perdendo”, sem oportunidades, sem chances, sendo estigmatizados diariamente. Falta-lhe espaços para pôr em práticas suas relações sociais que fortalecem os laços comunitários.

Seguem escassos os aparelhos de Estado, o acesso ao saneamento, o ingresso e continuidade nos estudos, a oportunidade no mercado de trabalho. Digas de onde és e te darei (ou não) um emprego… a lógica perversa da exclusão prevalece. Na vida real, longe da “glamorização”, morro e asfalto parecem como água e óleo.

Nas relações sociais estabelecidas, sejam quais forem as finalidades, impera o preconceito e a desconfiança. O fato de alguém ser preto, pobre e da periferia é uma condição aos preconceituosos e racistas para que essa pessoa não seja digna de confiança.

Vimos isso em caso recente, com do Davi Brito, ganhador do reality Big Brother Brasil. Não vou tecer comentários ao programa ou a sua conduta no jogo, visto que todo país, ou parte significativa dele, acompanhou e conhece bem o vencedor dessa última edição.

Depois de sair da casa, como todo ex-participante, Davi ganhou holofotes, potencializados pelo prêmio alcançado. Fato que chamou atenção foi a campanha que o mesmo realizou para ajudar vítimas da tragédia climática no Rio Grande do Sul. Inicialmente mais de setenta mil reais foi arrecadado e convertido em água, um bem essencial naquele cenário de destruição. Mesmo fazendo sua parte, recebeu críticas nas redes e cobranças acerca da arrecadação e correta destinação.

De fato, quem atua nessa linha de frente e arrecada valores oriundos de doações para ajudar terceiros, deve sim prestar contas, atuar com transparência. Diga-se: o que foi feito pelo Davi. Mas soa estranho a lógica dos dois pesos e duas medidas, não havendo a mesma atitude perante outros “famosos”, entidades e instituições.

Não dá para não pensar em um comportamento racista, que ainda está enraizado em nossa sociedade. Não falo do racismo que olha o negro como inferior a ser escravizado, mas do negro como um subtipo humano, de segunda ordem, sobre o qual deve ser lançado permanentemente o olhar da vigilância.

É sobre esse comportamento que precisamos nos policiar constantemente e que devemos agir para combater e eliminar de nossas relações. Davi poderia estar viajando com seu prêmio e ganhando ainda mais dinheiro com a visibilidade, com o potencial publicitário que alcançou. Mas está, assim como milhões de outros brasileiros, empenhado em ajudar os irmãos do sul do Brasil. Por que isso incomoda tanto?

Por que traz desconforto a foto sorrindo mostrando alimentos a serem destinados à tragédia? Em meio ao caos, não se pode comemorar a arrecadação e doação de quase duas mil cestas básicas, quase vinte mil quilos de alimentos, e centenas de fardos de água?

O trato com que a sociedade ainda tem para com pessoas pretas, oriundas da periferia e, portanto, pobres, ainda fala muito sobre a nossa herança racial.

Seguimos firmes e lutando para que viremos definitivamente essa página triste que segue sem um ponto final. Assim, quem sabe um dia possamos comemorar o sorriso da solidariedade sem o estigma do preconceito. Fazer o bem, sem olhar a quem, tal com9 repetido pelo Davi Brito.

Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.

Mostrar mais

Deixe um comentário

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo