
Quero chamar a atenção para um assunto importante e que afetará a todos em alguma medida. Ou, pelo menos, gostaríamos todos que fossemos alcançados pela longevidade e viver muitos anos.
No entanto, formar família, ver filhos crescerem, netos, bisnetos, não tem sido uma dádiva para toda população idosa do nosso país. Estamos envelhecendo enquanto nação, é verdade! Mas a forma como cuidamos dos nossos idosos como sociedade é uma questão que não nos traz qualquer ponta de orgulho.
O país ainda não trata adequadamente aqueles que ajudaram a construir a nação e a falta de políticas públicas reflete no descaso dos mais jovens para com as pessoas mais idosas. Isso não é exclusividade do Brasil e é comum na cultura ocidental, um tanto quanto diferente de nações orientais, que cultivam os mais velhos como fonte de sabedoria.
Fatores como classe social e cor impactam ainda mais no desafio de envelhecer no Brasil. Sobre o fator cor, por óbvio que grande parte da população idosa negra sofre dobrado com o peso do preconceito e a maioria absoluta dela sofre triplicado com o racismo estrutural e com o fato de ser pobre, oriunda do cortiço, parte vinda de uma linhagem direta dos escravos.
Quanto ao aspecto social, não há como não falar da precária estrutura de atendimento sanitário voltada a essa parte da população. Isso porque o famigerado sistema público de saúde impõe uma árdua e longa jornada na busca de atendimento e, ao contrário do que diz a letra da música, já não temos todo tempo do mundo. A escassez de políticas impõe uma condição ainda mais sacrificante aos nossos idosos.
O Estatuto do Idoso até que trouxe mecanismos para amenizar os impactos vividos. Mas o idoso não quer apenas respeito à sua condição na fila do supermercado ou da padaria, enquanto agoniza na fila do Sistema Único de Saúde, nos corredores dos hospitais ou à espera do atendimento previdenciário que parece nunca chegar.
Envelhecer deveria ser sinônimo de prestígio social. Os cabelos brancos e as rugas deveriam ser marcas a imprimir o respeito que se espera de quem ajudou a edificar uma nação. Contrariamente, vemos essas pessoas serem renegadas, acometidas por inúmeras doenças da idade e muitas vezes abandonadas em asilos.
Muitas vezes, sem alternativa adequada, recorrem a entidades ditas filantrópicas que se prontificam a ajudar pessoas da terceira idade. Muitas dessas instituições, porém, mascaram práticas abusivas e violentam os direitos dos idosos que são atendidos, tornando a vida deles um tormento ainda maior.
Idosos com problemas de saúde, como Alzheimer, mal de Parkinson, demência, diabetes, problemas cardiovasculares, catarata, osteoporose e tantas outras que se somam à fragilidade da própria idade.
Sem conhecer dos detalhes, ouvi recentemente comentários de que há até mesmo entidades, algumas delas que se dizem religiosas, vendendo aos idosos aquilo que recebe em doação e que deveria chegar a eles gratuitamente. Capítulo triste, escrito por quem deveria cuidar e proteger.
Tal prática, portanto, se comprovada, pouco se difere daquela extorsão realizada nas fraudes, que utilizam os nomes dos mais velhos e com pouco conhecimento para lhes aplicar golpes em suas aposentadorias, contraindo em seu nome empréstimos consignados, cuja cor do dinheiro o idoso nunca vê.
60 anos ou mais para quê? Poderiam questionar alguns diante de tantas injustiças, descasos e até falcatruas com nossa população idosa.
Mas esse é um ponto a servir de reflexão para todos nós, um pouco mais jovens. Lembremos que chegaremos lá também, ou pelo menos desejamos chegar. Se cremos que o passado se revela no presente para construirmos o futuro, mudemos nossas atitudes para sonhar com um tratamento mais humano e adequado quando a terceira idade bater à nossa porta.
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.