
Em janeiro deste ano, o mundo do futebol vivenciou um dos movimentos de mercados mais surpreendentes dos últimos tempos, quando o astro português Cristiano Ronaldo trocou o Manchester United pelo até então desconhecido Al-Nassr, da Arábia Saudita.
O grande público poderia não saber ainda, mas ali começava um processo grandioso para colocar esse país na corrida para sediar a Copa do Mundo de 2030 e fortalecer a liga de futebol local.
Nas últimas semanas, jogadores que brilhavam nos maiores clubes europeus, como é o caso de Karim Benzema, do Real Madrid, de Roberto Firmino, do Liverpool, e de N’Golo Kanté, do Chelsea, que trocaram a maior vitrine do futebol mundial para se aventurarem em um campeonato pouco comentado.
Essas transferências foram impulsionadas pelos bilhões de dólares à disposição dos principais clubes sauditas, que, com a ajuda da monarquia, conseguiram seduzir os atletas com salários astronômicos.
Para vestir a camisa 7 do Al-Nassr, Cristiano Ronaldo voltou ao posto de jogador mais bem pago do mundo. O português recebe cerca de 200 milhões de euros por ano (cerca de R$ 1,06 bilhão).
Para Thiago Freitas, COO da Roc Nation, a escalada dos árabes no mercado de transferências gera transformações em todo o ecossistema do futebol:
“Esse movimento não gera consequências apenas nos orçamentos dos clubes sauditas e dos atletas que são contratados, mas impacta toda a ‘pirâmide’ do futebol europeu. Quando um clube europeu recebe um valor, digamos, não esperado, pela transferência de um atleta que já não é uma jovem promessa, parte considerável desse recurso tende a ser destinado para a substituição desse profissional”.
Em junho, o FIP (Fundo de Investimentos Públicos da Arábia Saudita) comprou os quatro principais clubes da elite saudita: Al-Nassr, Al-Ittihad, Al-Hilal e Al-Ahli.
Dessa forma, os clubes foram transformados em empresas do fundo da monarquia saudita. O FIP tem direito a 75% da fatia de cada time, e o restante fica à disposição para outros acordos.
Segundo dados do IFW Institute (instituto alemão de pesquisa econômica independente e sem fins lucrativos), o fundo dispõe de 620 bilhões de dólares (cerca de R$ 2,9 trilhões, na conversão de valores) em ativos financeiros.
“Em um processo que guarda algumas semelhanças com o que passa o Brasil com as SAF´s, os alguns clubes passarão às mãos da iniciativa privada. Aqui, os clubes são majoritariamente associações, portanto não têm um dono definido. Lá, os clubes são de propriedade do Estado, normalmente nas mãos de membros da família real”, afirma o advogado Eduardo Carlezzo, que estuda o mercado saudita.
Em 2021, o fundo fez um grande investimento no futebol, ao comprar 80% do Newcastle, tradicional clube inglês, que disputa a Premier League, por cerca de 300 milhões de libras — cerca de R$ 2,2 bilhões, na época.
Al-Nassr:
Cristiano Ronaldo
Brozovic
Seko Fofana
Alex Telles (faltam detalhes)
Sadio Mané (negociando)
Al-Ahli:
Edouard Mendy
Roberto Firmino
Riyad Mahrez (faltam detalhes)
Saint-Maximin (faltam detalhes)
Al-Ittihad:
Jota
Karim Benzema
N’Golo Kanté
Fabinho (faltam detalhes)
Al-Hilal:
Rúben Neves
Milinković-Savić
Koulibaly
Mitrović (em negociação)
Malcom (em negociação)
Al-Ettifaq (único da lista a não ter sido comprado pelo fundo soberano):
Gerrard – treinador
Jordan Henderson
Origi (interesse)
A grande questão que fica no ar na primeira divisão saudita é em relação à competitividade, já que os outros 14 clubes do torneio não recebem o apoio estatal.
Desde a primeira temporada, em 1975, os quatro times comprados pelo FIP ganharam 39 das 48 edições. Para o futuro da competição, imprevisibilidade parece não ser uma das características dessa disputa.
O maior país do Oriente Médio em extensão tem na extração do petróleo sua principal atividade econômica.
Segundo dados da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), a Arábia Saudita tem a segunda maior reserva de petróleo do mundo, com cerca de 297,5 bilhões de barris, que corresponde a 17% da produção e exportação mundial dessa matéria-prima, atrás apenas da Venezuela.
“A indústria petroleira é muito desenvolvida, mas a Arábia Saudita tem tentado diversificar a produção, desenvolveu técnicas de agricultura em algumas regiões do país e as grandes cidades se desenvolveram como grandes centros financeiros e de economia diversificada”, explica Manuel Furriela, professor de relações internacionais na FMU.