
O Ministério das Relações Exteriores israelense reagiu com cautela, mas o embaixador de Israel no Brasil, Daniel Gazit, e analistas políticos locais criticaram as palavras do líder brasileiro.
Lula afirmou, em encontro com o presidente sírio, Bashar Al-Assad, que apóia a criação de um Estado palestino e que “a continuada ocupação de territórios palestinos, a manutenção e a expansão de assentamentos são inaceitáveis”.
O presidente também informou que o Brasil “está votando nas Nações Unidas em favor da resolução que exige a devolução à Síria das Colinas do Golã”.
Críticas
David Saranga, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores israelense, disse que seu país concorda com Lula na questão da criação de um Estado palestino, mas que ainda há dúvidas quanto às intenções pacíficas desse futuro país.
“Nossa preocupação é apenas quanto ao caráter desse Estado, se ele vai apoiar o terrorismo ou não”, disse Saranga.
Quanto à ocupação da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, Saranga afirmou que Israel “tem feito o máximo para melhorar a situação da população e descomplicar o dia-a-dia dos palestinos”. O porta-voz concluiu que “não há nenhum motivo de discórdia entre Israel e Brasil”.
Apesar da cautela diplomática da chancelaria, o embaixador israelense no Brasil, Daniel Gazit, respondeu ao discurso de Lula com alguma irritação, principalmente na questão da devolução à Síria das Colinas do Golã.
“Israel só está no Golã por causa dos ataques sírios diários que partiam da região antes de 1967 (quando, após a vitória na Guerra dos Seis Dias sobre a Síria, Israel conquistou o conjunto de montanhas na fronteira entre os dois países)”, disse Gazit. “Vamos pensar seriamente em devolver o Golã se a Síria realmente quiser assinar um acordo de paz conosco. O problema é que não temos certeza das intenções dos sírios”, concluiu.
Gazit afirmou que Israel já provou mais de uma vez que quer a paz com seus vizinhos, ao assinar acordos tanto com o Egito (1978) quanto com a Jordânia (1994).
Mal-estar
A visita de Lula a cinco países árabes no Oriente Médio causou mal-estar em alguns círculos, principalmente entre analistas políticos de direita. Efraim Innbar, professor da Universidade Bar-Ilan e diretor do Instituto Begin-Sadat, disse que Lula deveria escolher melhor seus roteiros de viagem.
“O presidente brasileiro deveria vir a Israel e conhecer o que é Primeiro Mundo, e não ficar passeando em países ditatoriais. Se ele quer ser amigo dos árabes, problema dele. Mas espero que Lula tenha mais maturidade no futuro”, reagiu Innbar.
Para o professor, a viagem de Lula ao Oriente Médio, excluindo Israel, apesar de ter motivação econômica, pode acabar incitando o anti-semitismo no Brasil.
“Gostamos muito do futebol brasileiro, mas o Brasil deveria jogar melhor no campo de suas relações diplomáticas”, brincou Innbar.
Meses antes da ida de Lula ao Oriente Médio, Israel já se preocupava com a repercussão da viagem.
“Não quisemos pressionar o Itamaraty a incluir Israel no roteiro, mas sabíamos que em algum momento Lula passaria a falar de política, mesmo que a viagem tenha cunho comercial”, disse uma fonte da embaixada israelense em Brasília.
Para o principal repórter político do jornal israelense Haaretz, Aluf Benn, Israel não pressionou Lula a visitar o país por uma razão óbvia: se o presidente brasileiro fosse a Israel, com certeza marcaria encontro também com o presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Yasser Arafat.
E o governo de Israel se recusa a receber quem se encontra com Arafat, considerado pelo governo do primeiro-ministro Ariel Sharon como o maior obstáculo para a paz com os palestinos. Israel cortou relações com Arafat há dois anos, tempo que mantém o presidente da ANP recluso em seu quartel-general em Ramala, na Cisjordânia.
A fonte da embaixada israelense concorda. “Como sabíamos que ele iria provavelmente querer se encontrar com Arafat, preferimos que ele não fosse mesmo a Israel. É melhor assim.”
Apesar de não se reunir com Arafat, Lula acabou marcando encontro com o novo primeiro-ministro palestino, Ahmed Kurea (conhecido como Abu Alá), no Egito, o que piorou o mal-estar entre os israelenses.
Apesar de todas as críticas à visita de Lula ao Oriente Médio, a maioria absoluta dos israelenses ignora a presença de Lula na região e sequer soube do discurso do presidente brasileiro em Damasco. Nesta quinta-feira, jornais israelenses como o Haaretz e o Maariv citaram Lula apenas nas entrelinhas de matérias sobre a proposta de retomada de negociação de paz entre Síria e Israel feita por Bashar Al-Assad na segunda-feira, em entrevista ao jornal americano The New York Times.
“A verdade é que Israel não se importa com o que pensa o Brasil. Está longe de ser a nossa prioridade”, disse Aluf Ben.
(fonte: BBC)