Com a atualização, qualquer valor de 120 a 139 mmHg de pressão sistólica ou de 80 a 89 mmHg de pressão diastólica passa a exigir monitoramento e medidas preventivas. A nova classificação busca ampliar o alerta sobre os riscos à saúde mesmo antes da instalação definitiva da hipertensão, tradicionalmente diagnosticada a partir de 14 por 9 (ou 140/90 mmHg). A ideia central é agir antes que a pressão alta cause danos silenciosos e muitas vezes irreversíveis.
A principal recomendação da diretriz é que, ao identificar esse estágio intermediário, a pré-hipertensão, o médico oriente mudanças de comportamento e estilo de vida. Em alguns casos, a depender do risco cardiovascular do paciente, já pode haver indicação de medicamentos. Trata-se de um movimento importante, voltado para a prevenção e para um cuidado mais eficiente com a saúde cardiovascular da população.
Além da reclassificação, o documento também endurece as metas de controle para pacientes hipertensos já diagnosticados. A partir de agora, o objetivo é manter a pressão abaixo de 13 por 8 (130/80 mmHg) em todos os casos, independentemente da idade, presença de outras doenças ou sexo. Isso marca uma mudança significativa em relação às diretrizes anteriores, que toleravam níveis mais altos em certos grupos, como idosos.
Outra novidade é o uso de uma ferramenta de cálculo de risco global, chamada escore PREVENT, que ajuda o médico a estimar a chance de um paciente desenvolver um evento cardiovascular, como infarto ou AVC, em até dez anos. Esse escore leva em consideração fatores como obesidade, diabetes, colesterol alto, tabagismo, histórico familiar e lesões em órgãos como coração e rins. A partir desse mapeamento, o cuidado deixa de focar apenas na pressão isolada e passa a considerar todo o contexto de saúde do indivíduo.
A nova diretriz também traz um olhar mais atento para a realidade do Sistema Único de Saúde (SUS), que atende cerca de 75% dos brasileiros com hipertensão. Pela primeira vez, o documento dedica um capítulo exclusivo ao SUS, com orientações práticas para os profissionais da atenção básica. Entre as estratégias estão o uso de medicamentos já disponíveis na rede pública, a organização de protocolos clínicos para acompanhamento regular e o incentivo ao uso de tecnologias como o MAPA (monitoramento ambulatorial) e o MRPA (monitoramento residencial da pressão arterial), quando disponíveis.
O cuidado com a saúde da mulher também ganhou espaço de forma inédita na diretriz. O texto recomenda atenção especial em fases como gestação, uso de anticoncepcionais e menopausa, que são momentos de maior vulnerabilidade para o desenvolvimento de hipertensão. Mulheres que apresentaram pressão alta durante a gravidez, por exemplo, devem ser acompanhadas ao longo da vida, pois o histórico aumenta o risco de doenças cardiovasculares no futuro. Durante o uso de anticoncepcionais hormonais, a recomendação é que a pressão seja monitorada regularmente.
Além das recomendações clínicas, o documento reforça as já conhecidas e frequentemente negligenciadas mudanças de estilo de vida: manter o peso sob controle, reduzir o consumo de sal, adotar uma alimentação rica em frutas, verduras e potássio (como a dieta DASH), praticar exercícios físicos regularmente, controlar o estresse e evitar o consumo de álcool e tabaco.
No tratamento medicamentoso, o novo protocolo indica que a maioria dos pacientes deve iniciar o uso de dois medicamentos em baixa dose, preferencialmente combinados em um único comprimido. Essa abordagem aumenta a adesão ao tratamento e melhora o controle da pressão. As classes recomendadas incluem diuréticos, inibidores da ECA, bloqueadores dos receptores de angiotensina e bloqueadores de canais de cálcio.
Atualmente, cerca de um terço da população adulta brasileira convive com a hipertensão, de acordo com dados das sociedades médicas especializadas. Ainda assim, apenas uma pequena parte dos pacientes consegue manter a pressão realmente sob controle. A hipertensão é uma doença silenciosa, mas é o principal fator de risco para infarto, acidente vascular cerebral (AVC), insuficiência renal e morte precoce.
Com a reclassificação da pressão “12 por 8” para a zona de pré-hipertensão, as novas metas mais rígidas e um olhar mais sensível às populações específicas como as mulheres e os usuários do SUS, a diretriz amplia o escopo da prevenção cardiovascular no país. O desafio agora é fazer com que essas recomendações saiam do papel e se transformem em ações concretas nos consultórios e nas unidades de saúde pública. A saúde do coração agradece.