Ícone do site Jornal Itaqui Bacanga

Continua caro sobreviver no Brasil

Dr. Osmar Gomes

Longe dos holofotes dos bares e restaurantes “instagramáveis”, estão milhões de brasileiros que ainda vivem na berlinda entre o ter e o não ter o que colocar sobre a mesa. Embora o país tenha avançado e saído do Mapa da Fome, ainda paira a insegurança alimentar sobre a maior parcela da população.

A incerteza diz respeito ao fato de que não basta, com base apenas em números, muitas vezes separados por uma linha tênue, estar dentro ou fora do tal mapa. “Ser ou não ser”, já dizia Shakespeare. Muito além do estar ou não estar, é o “como estar”, e como essa condição pode ser impactada por questões circunstanciais.

Nesta semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve a taxa de juros, a chamada Selic, em 15%. Na prática, a taxa real chega a quase 10%, sendo a segunda maior do mundo — atrás apenas da Turquia, com cerca de 12%.

A grande questão que se coloca para esse cenário desafiador é: quando será mais barato viver no Brasil? Além dos muitos e altos impostos — que abarcam grande parte do nosso consumo, alguns chegando a quase 50% do preço final; aprendemos a conviver, nos últimos anos, com elevadas taxas de juros.

Decerto, o verbo “aprender”, conjugado acima na terceira pessoa do plural, é mero eufemismo para o grande esforço feito por todos os brasileiros para sobreviver. E não são apenas os mais pobres os afetados pela alta taxa de juros. O chamado “custo Brasil” cobra um preço alto de todos que lutam para edificar a nação.

A manutenção da taxa gera expectativa de uma eventual reversão na sequência de altas, porém confirma que o arrocho no controle do consumo deve se prolongar. A decisão do Copom não foi surpresa, mas gerou reclamações de vários setores, unindo patrões e empregados em coro crítico contra a política adotada pelo Banco Central.

Federações, associações, sindicatos: o grito é geral e em tom uníssono. O Brasil precisa entrar em um processo de redução da taxa de juros, sob pena de a economia estagnar. O contexto global já apresenta inúmeras ameaças, em meio à guerra bélica, política e econômica, e, portanto, não precisamos criar nosso próprio campo de batalha.

É claro que, por analogia, a economia necessita de seus freios e contrapesos, entretanto é possível buscar um ponto de equilíbrio um pouco mais abaixo. A título de exemplo: a Argentina, que há pouco esteve quase no fundo do poço, possui hoje uma taxa de cerca de 6%.

A elevada taxa gera impacto negativo em diversos segmentos do setor produtivo, especialmente na indústria e na construção civil. Também traz prejuízos ao crescimento e sufoca a economia, já combalida com o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e os efeitos do chamado tarifaço de Trump.

Os efeitos da alta vêm igualmente em cadeia: elevam parcelas de financiamentos atrelados à Selic, aumentam o índice de inadimplência e retiram dinheiro de circulação, que acaba sendo direcionado ao investimento especulativo. Novos negócios deixam de ser criados, empregos deixam de ser gerados, ou são perdidos, e o consumo das famílias recua.

Por falar em famílias, a crítica à alta taxa de juros, levantada pelas centrais sindicais, reforça a análise de que o atual modelo alimenta um sistema que redireciona dinheiro dos consumidores, das empresas e do Estado para o setor financeiro, meramente especulativo.

É bom que se diga: setor este que é um dos grandes responsáveis pela enorme desigualdade socioeconômica que o país enfrenta.

Entendo que o Copom é formado por especialistas, todavia chego à conclusão de que o Brasil ainda carece de um projeto de país; um projeto cujas políticas sejam efetivamente pensadas à luz daqueles que mais necessitam e que proponha um progresso real e sustentável.

Potencial nós temos – da matéria-prima à mão de obra. Contudo, enquanto isso não acontece, seguimos perecendo, perdendo oportunidades e sacrificando gerações inteiras, sob pretextos ainda pouco compreensíveis.

*Osmar Gomes dos Santos é Juiz de Direito na Comarca da Ilha de São Luís (MA). Membro das Academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas, da ALMA – Academia Literária do Maranhão, e da AMCAL – Academia Matinhense de Ciências, Artes e Letras.

Sair da versão mobile