Ouso afirmar, evidentemente sem base estatística, mas por observação que essa chamada classe mais vulnerável, a dos idosos acima de sessenta anos, não é inteiramente verdade. Acho que os verdadeiramente vulneráveis são os idosos pobres. Isso não quer dizer que todos são vulneráveis, mas a pobreza faz alguns mais vulneráveis.
Os que têm condições conseguem guardar o isolamento social por longo tempo, são informados e, assim, vão evitando se infectar. Mas os que moram em casas pequenas, com muita gente, em favelas, sem água tratada, sem esgotamento sanitário, e que precisam ir para a infame fila da Caixa para poder alimentar a família, os que vivem de pequenos negócios, sem estrutura e sem financiamento, onde todos na casa precisam se virar e sair, com grandes riscos de contaminação, quando voltam são, ao meu ver, os verdadeiros vulneráveis. Ou seja, os pobres são os mais vulneráveis. Por isso, nenhum lockdown dará certo no Norte e no Nordeste brasileiro, pois temos uma grande parte da população muito pobre.
Temos que deixar de achar que pobreza é normal ou pensar que “é assim mesmo” e ajudar os pobres a sair da pobreza. O mundo compreende isso melhor hoje e, acredito, que está disposto a ajudar para evitar futuras pandemias, cada vez piores. Mas, cabe a nós, que conhecemos melhor a nossa própria realidade, planejar a melhor maneira de resolvermos nossos problemas. Temos uma certeza, o aumento de renda das pessoas, hoje pobres ou muito pobres, é a única maneira de avançarmos. Assim, a solução tem que vir de programas que quebrem a corrente que mantém e amplia a pobreza. Só para clarear o raciocínio se a pessoa aumentar, consistentemente, a sua renda vai sair logo da favela, vai morar em um lugar que tenha melhor estrutura para a família. Isso não é um chute, isso está na história da evolução dos povos. Basta estudar os dados da ONU sobre a evolução de renda no mundo para ver que as pessoas vivem em qualquer lugar do mundo da mesma maneira, de acordo com a renda que dispõem. Isso não depende de religião, de país, de continente. O mesmo, se dá em todos os intervalos de renda que tenham as famílias.
Acredito que o mundo reconhece isso e está sensível ao problema. Se tivermos um projeto eficiente de combate à pobreza é muito possível que consigamos obter financiamento para pô-lo em prática. Mas, como fazer isso?
Proposta de combate à pobreza – O meu projeto seria formado por quatro ações distintas, mas com o mesmo objetivo: a primeira seria o fornecimento de água tratada, limpa e ligação a um sistema moderno de tratamento de esgoto a todas as residências do estado, começando pela ilha de São Luís. Isso conteria a mortalidade infantil, diminuiria muito os gastos com saúde e tornaria nossas praias balneáveis o que nos traria a indústria do turismo.
A segunda seria dar mão forte às famílias pobres, com crianças de 0 a 6 anos. Essas crianças receberiam boa e adequada alimentação e seriam educadas para viver em sociedade, saber como se ganha dinheiro, o respeito as leis, seriam ensinadas a ler e escrever, além de cálculos básicos, esporte e cultura, tudo como preconiza o prêmio Nobel de Economia, professor da Universidade de Chicago, James Heckman. Com isso, essas crianças chegariam ao Ensino Fundamental em igualdade de condições com qualquer criança, acabando com a pior das desigualdades que tira oportunidades aos mais desfavorecidos. Os filhos desses meninos já não precisarão da ajuda do estado, quebrando a corrente da pobreza.
A terceira seria preparar as pessoas pobres para o trabalho, não só ensinando muito bem uma determinada profissão, mas ensinando-os como empreender, como usar os bancos como se organizar para ganhar dinheiro.
A quarta seria criar Cooperativas de Crédito para emprestar, a juros muito baixos, dinheiro para as pequenas e médias empresas que são as maiores empregadoras. E ajudá-los a ser empresários, como estudar o mercado, entrega, como escolher a matéria prima, etc.
Meu projeto passa por preparar termos de referência bem elaborados das quatro ações e lutar para conseguir os recursos necessários para colocá-las em prática. Se aumentarmos a renda dessas pessoas, estaremos no caminho certo.
Quando se faz um esforço, envolvendo as pessoas interessadas, o resultado tem grande possibilidade de dar certo. Vou citar um caso difícil de resolver, que envolvia muitos parâmetros e que pela discussão aberta de seus problemas se tornou emblemático. É o do desenvolvimento da aviação comercial. Nos anos 1930, voar era realmente perigoso e os passageiros ficavam assustados com tantos acidentes. Autoridades aéreas ao redor do mundo haviam compreendido o potencial do tráfego aéreo comercial de passageiros, mas também se deram conta de que voar teria que se tornar mais seguro, antes que a maioria das pessoas ousassem entrar em um avião. Em 1944, elas se reuniram em Chicago para negociar regras comuns e assinaram um contrato, com um anexo muito importante, o Anexo 13: um formulário em comum para registro de incidentes, o qual todos concordaram em compartilhar, de forma que pudessem aprender com os erros uns dos outros.
Desde então, cada acidente ou incidente envolvendo um avião comercial de passageiros, tem sido investigado e relatado; fatores de risco têm sido sistematicamente identificados; e procedimentos de segurança cada vez mais aperfeiçoados têm sido adotados globalmente. Pela sua importância, a Convenção de Chicago é uma das maiores colaborações da história da humanidade. É impressionante como as pessoas podem trabalhar juntas quando compartilham os mesmos temores.
O instinto do medo é tão forte que pode fazer com que as pessoas ao redor do planeta colaborem para atingir grandes avanços. Para dar um exemplo dos resultados dessa colaboração, em 2016, um total de 40 milhões de voos de passageiros comerciais pousou em segurança em seus destinos. Somente dez terminaram em acidentes fatais, com grande destaque nos jornais. Enquanto isso, nesse ano, morreram, por diarreia, 330 mil crianças. E isso não gerou notícia nenhuma.
Hoje temos um laço especial com a China, pois de nossos portos partem todos os dias navios com minério ou grão para lá. Daqui a vinte anos, segundo a ONU, a Ásia e a África terão grande aumento de renda e população. O eixo global de consumo se mudará de lugar. Hoje, o Atlântico Norte tem 60% do comércio global. Daqui a vinte anos mudará para o Oceano Índico que fará 60% dele.
Quando estive em Xiamen, na China, para participar da reunião dos BRICS, assisti Xi Jinping, presidente da China, dizer que o Novo Banco de Desenvolvimento, dos BRICS, tem muito dinheiro e não tem projetos. Hoje, pelo rodízio estabelecido, o presidente é um brasileiro. Parece-me um bom caminho.
ARTIGO: SOMOS MUITO VULNERÁVEIS
